Apoiar um governo que perde tantos ministros é difícil, diz executivo

Publicado em 09/12/2016
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Um dos principais porta-vozes dos grandes varejistas, o empresário Antonio Carlos Pipponzi, presidente do conselho da Raia Drogasil, maior rede de farmácias do país, avalia que o governo Temer perde força para aprovar as reformas quando surgem novas notícias de corrupção.
 
"Cada vez que isso acontece, a credibilidade do presidente diminui e, evidentemente, o apoio para as reformas fica mais difícil."
 
Ele ressalva que ainda é irresponsável falar em "fora, Temer" neste momento delicado do país, mas reconhece ser difícil apoiar um presidente cujo governo perde tantos ministros em pouco tempo.
 
Pipponzi segue acreditando na equipe econômica e vê pontos positivos surgirem da crise, como o engajamento político da população, que aprendeu a cobrar o governo.
 
"Se tem uma coisa que os político não gostam é do povo na rua", afirma.
 
Pipponzi, que é vice-presidente do IDV (Instituto para Desenvolvimento do Varejo), defende que, se empresas e trabalhadores tiverem autonomia para negociar jornadas, os funcionários jovens conseguirão tempo disponível para investir nos estudos.
 
Folha - Voltou o pior das crises política e econômica juntas?
 
Antonio Carlos Pipponzi - Não solucionamos a crise política nem a econômica. Temos um direcionamento econômico que começou a resgatar, pelos menos nos primeiros meses, um pouco do otimismo. Mas não será dado ao governo um desconto pelo fato de ser transitório.
 
A equipe econômica é muito adequada, a gestão de Henrique Meirelles [ministro da Fazenda] consegue ver o que o país precisa. Mas apoio popular não terá. Composição no Congresso para a aprovação de medidas depende sempre desse tipo de acordo que é frágil no momento que o país vive. Com a Lava Jato, em que uma grande parte dos políticos está implicada, a situação é frágil.
 
O que o empresariado vê?
 
Crise política, econômica e ambiente externo desfavorável. De um lado, dá para ser otimista porque descemos a tal ponto, no fundo do poço da ética e da má gestão financeira, que daqui para a frente só dá para melhorar.
 
Quando os Estados chegam a ponto de não ter dinheiro para pagar 13° salário, não adianta, é preciso adotar remédios amargos, tem que colocar na mesa medidas impopulares.
 
Há duas medidas fundamentais para o país respirar: aprovação da PEC do Teto e reforma da Previdência.
 
Depois do caso do apartamento que levou à saída do ex-ministro Geddel Vieira Lima, Temer tem condições de pedir que a população compreenda as medidas duras?
 
Cada vez que isso acontece, a credibilidade do presidente diminui e, evidentemente, o apoio para as reformas vai se complicando.
 
É difícil apoiar um presidente em cujo governo tantos ministros são afastados por suspeita de corrupção e em tão pouco tempo.
 
Todavia, entendo que esse ministério foi escolhido para manter a capacidade de articulação política que ele julgou necessária para a aprovação das reformas. Não são reformas só do presidente Michel Temer. São reformas que o país necessita para que a economia volte a girar.
 
Qual é o maior problema do país?
 
Na essência é a educação para formar cidadãos na plenitude, que consigam entender a correlação direta entre o voto e a vida que terão. Isso começa por um ensino de qualidade, algo de que estamos distantes.
 
Mas há um aspecto positivo: mesmo com a educação não tendo evoluído, hoje temos uma população que participa muito mais. Voltou-se a falar em passeata e então houve recuo. Se tem uma coisa que os políticos não gostam, é do povo na rua.
 
Como melhorar o mercado de trabalho?
 
É essencial que se promovam mudanças que possibilitem que empresas e funcionários façam acordos para a adoção de jornada de trabalho mais favorável a ambos.
 
O varejo é a porta de entrada mais usual para o jovem no mercado de trabalho. E, se ele pode negociar uma jornada mais curta, receberá para pagar seus estudos e terá o tempo para estudar e chegar disposto à escola.
 
Da forma como acontece hoje, é o contrário: ele não consegue fazer bem nem uma coisa nem outra e termina, muitas vezes, abandonando os estudos.
 
A figura do empresário que pede ajuda do governo tem que acabar?
 
Acho que as crises provocam o amadurecimento. É ilusão pensar que uma empresa pode ser sustentável num país permanentemente em crise.
 
As organizações empresariais devem se colocar como protagonistas das mudanças, participando das reformas estruturais do país com contribuições que contemplem a realidade.
 
Como pesa o custo do dinheiro no varejo?
 
O varejo em geral é muito sensível ao custo do dinheiro. É fato que o movimento das taxas de juros nominais faz parte de uma política econômica que nesse instante deve ser manejada com cuidado e competência.
 
Porém, qualquer que seja esse movimento, a baixa competitividade no setor financeiro faz com que o dinheiro chegue a um custo impraticável na ponta final. É fundamental elevar a competição entre os bancos.
 
Como vai o varejo farmacêutico?
 
Ele é menos sensível às crises econômicas porque não depende de crédito.
 
E a tendência de avançar para os modelos americanos, que vendem outros produtos além de farmacêuticos?
 
A regulação permite, mas hoje até se pensa em dar um passo atrás. Está a cargo dos Estados, e a maioria permite mix variado. Mas faz sentido uma empresa de saúde, beleza e bem-estar vender bolacha? Nós vendemos chocolate e bala, sim, mas é dietético.
 
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RAIO-X
 
Carreira
Presidente do conselho de administração da Raia Drogasil; vice do IDV (Instituto para Desenvolvimento do Varejo); vice do conselho do Fundo Patrimonial Amigos da Poli
 
Formação
Graduado em engenharia civil pela Poli-USP e em administração de empresas pela EAESP FGV
 
Trajetória
Na Raia S.A., foi diretor administrativo e financeiro, diretor-superintendente e diretor-presidente
 
 
Fonte: Folha de S. Paulo
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