A cada ano que se inicia, é comum fazermos uma retrospectiva, um balanço do ano anterior e definirmos novas metas e planos de ação para o ano corrente. Contudo, é necessário saber o que se quer conquistar na vida em termos gerais.

Folheando livros em uma livraria paulistana, me deparei com o poeta maranhense, Ferreira Gullar, com a célebre frase: “Eu prefiro ser feliz a ter razão”, estimulo que me motivou a escrever este artigo.

Nossa existência é constituída pelas escolhas que fazemos em cada fase de vida que vivemos. Ainda que muitos duvidem, não somos a mesma pessoa de cinco minutos atrás, estamos em constante estado de evolução, física, biológica e mentalmente. É comum e percebido por alguns que, em cada fase vivida elegemos, conscientemente ou não, nossos motivadores de acordo com os nossos valores e crenças, que serão nosso norte atitudinal para o desenvolvimento de nossas ações e relacionamentos ao longo da vida.

Alguns já descobriram, acessaram e vivem suas vidas de forma congruente com seus propósitos, outros ainda resistem à mudança ou já iniciaram um investimento em autoconhecimento. Seja lá como for, cada um percebe e age de acordo com suas necessidades e em seu tempo. Acredite, todos estão certos, mas nem todos obtém os resultados esperados com suas ações empreendidas. Esta é a grande diferença entre ter a razão da “certeza das melhores ações” e a felicidade dos resultados obtidos.

Comumente observo que, os principais motivadores pessoais são: razão e felicidade. Em minha percepção, vivemos três principais fases ao longo da vida, que classifico, para ilustrar como: hormonal (0 – 39 anos), neuronal (40 – 59 anos) e da sabedoria (60 em diante). Na fase hormonal algumas pessoas são naturalmente rápidas, intensas e ávidas por se impor a tudo e a todos em busca de ter razão, “sempre” que possível!. Já na neuronal, tendem a um comportamento mais sereno, seletivo, paciencioso a ponto de escolherem com o que se envolver ou se preocupar, pois renunciam à razão em busca de felicidade. A fase da sabedoria caracteriza-se pela paciência, escolha assumida pela felicidade e qualidade de vida (emocional), visando aproveitar intensamente o que há para ser vivido na melhor idade, pois nessa fase, tem-se mais passado do que futuro.

É instigante essa correlação entre: razão x felicidade. O que realmente move as pessoas a quererem se sentir felizes, mas ao mesmo tempo, por parte de alguns, essa obsessão de querer ter razão? Esse dilema tomou conta de alguns relacionamentos amorosos, parentais, sociais, empresariais, profissionais e, desta forma, tem causado brigas, confusões, ressentimentos e rupturas e, a infelicidade se consolida nestes casos.

Essa “necessidade de ter razão” tem sua origem no individualismo. E ao buscarmos a origem do individualismo nos deparamos com o egoísmo, uma estrutura emocional infantil que ainda gerencia a personalidade de alguns, mesmo na fase adulta.

Sobre o individualismo, aconselho não confundir individuação e individualismo, pois, são bem diferentes. Porém, na busca da individuação muitos acabam se perdendo no individualismo.

Na vivência do processo de individuação, eu descubro quem sou, o que não sou, do que gosto, do que não gosto, reconheço potenciais, ferramentas, mas também ganho sabedoria, humildade, e com elas percebo que sou parte de um todo bem maior que meu próprio umbigo e mente. Descubro que coexisto, querendo ou não, com múltiplas formas de vida, com consciências as mais diversas numa relação interdependente, o que pode me levar a despertar o altruísmo, à generosidade, à solidariedade, à compreensão.

Quando coexistimos, uma vida só existe porque está em relação com outras. Assim, compartilhamos o sol, oxigênio, água, terra e tudo o mais que o planeta nos oferece. Com isso, sem querer ou com consciência e escolha ativa, geramos vida e usufruímos dela.

Quando vivemos o individualismo pensamos que somos o centro do Universo e que todo o resto deve orbitar ao redor de nosso próprio umbigo.

Quando agimos de forma individualista ou egoísta, buscamos impor nossa opinião e vontade, e assim, nos ressentindo com qualquer opinião divergente ou com qualquer tipo de atitude que não esteja de acordo com nosso “real” desejo. Ou seja, se o outro não obedece ao meu “desígnio supremo” ele não é digno de minha companhia ou ele é tratado como um alguém inferior ou como não confiável, ou pior, aquele a quem podemos maltratar dizendo palavras agressivas. Na adolescência, é comum dividirmos os grupos em “panelas”, as dos que pensam como nós e “são bons”, e a dos “outros”, os que não pensam como nós e “são ruins”. Instala-se assim a dicotomia relativista e alienante, capaz de gerar guerras.

Por vezes, nas relações pessoais, dificultamos a situação quando atuamos com prepotência e arrogância, sofrendo uma inibição de nossa lucidez e inteligência, e estas, uma vez comprometidas, pelo nosso alto engrandecimento inadequado de nossa imagem, faz com que distorçamos os fatos, passando a agir como vítima e a responsabilizar os outros por nosso mal estar ou pelo acontecido. Quando muitas vezes, a realidade é que ambos colaboramos para a dificultar o entendimento no relacionamento, por agirmos exatamente da mesma maneira, cada qual “certo” de suas “verdades”, desconectados do outro e a tal “mania de ter razão”. Assim, cria-se uma confusão frequente e muito comum, mas de difícil solução.

O egoísmo age como um grande sabotador de relações, que desconecta corações, enrijece a sensibilidade e dificulta nossa percepção clara da vida. O egoísmo e a prepotência nos fazem pensar que temos direitos que não existem. Fazem nos sentir injustiçados, enraivecidos, indignados, irritados, e o pior, em nada ajudam a ampliar nossa sabedoria sobre a situação, para enxerga-la com isenção, clareza e discernimento, quando encontramos caminhos para a conciliação ou a resolução dos conflitos.

Os que buscam avidamente pela razão -“donos da verdade”, tem dificuldade de enxergar e compreender diferentes pontos de vista. Acreditam que enxergam mais que todos, mas estão cegos para a realidade a sua volta.

Podem até serem rápidos na argumentação, ágeis com as palavras, mas isso não significa sabedoria ou inteligência, como pensam alguns.

Neste caso, o que fazer? Será que abrir mão de sua opinião/ razão, pode ser um caminho para a flexibilização e assim gerar mais felicidade?

Isso depende, pois pode ser apenas mais uma forma de reatividade, porém, contrária, ao invés de me impor, omito-me, com certeza não sentirei bem estar, poderei sentir angustia, tristeza, ou sentir-me sufocado, porque a causa de tudo, o egoísmo e a vaidade, estão lá, agindo, ainda que nos subterrâneos da percepção consciente.

Se esta decisão advém do coração, que está ocupado também em criar bem estar e felicidade para os outros, tudo pode mudar. As decisões afetuosas podem gerar bem estar, ainda que requeiram de nós algum sacrifício e exposição momentâneos. Porque a felicidade está ligada à capacidade afetiva. Permitir-se desenvolver ternura, doçura, amabilidade, tolerância, traz bem estar íntimo, além de criar novas estruturas emocionais e psicológicas modificando o modo de perceber e interagir com a vida.

Desta forma, surge a capacidade de se utilizar a mente embasada na inteligência afetiva, característica daqueles que superaram a infância emocional.

Se for o caso, até que o egoísmo seja enfraquecido, cultive o silêncio, seja mais tolerante e ponderado, essas atitudes serão providenciais. Aprenda a ouvir, a sentir empatia pelo outro, por outras opiniões, renunciando ao seu mundo autocentrado, percebendo-se como parte de um todo maior (relacional, social, bioquímico, espiritual), sentindo a si e aos outros como forças de igual relevância para o todo da vida, é outro passo nessa nova caminhada.

Reflita mais e submeta suas opiniões sob a ótica da afetividade, da ética, da justiça, da responsabilidade, da compaixão, do não julgamento e do não preconceito, antes de manifestá-las, essa atitude será um importante diferencial para ser mais feliz em sua vida.

Marcio Caldellas – Psicólogo clínico, Personal, Career & Executive Coach certificado pela Sociedade Brasileira de Coaching e BCI – Behavioral Coaching Institute – USA. Sólida carreira desenvolvida em Executive Search como Headhunter atuando com posições executivas. – www.mccoaching.net